O que são movimentos sociais e como eles surgem?
Eles são um fenômeno histórico e social que começou a ser estudado entre os séculos 18 e 19. Neste artigo, você conhece alguns exemplos de movimentos, como eles se organizam e quais impactos têm na vida em sociedade

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O que são movimentos sociais? Como se organizam? O que reivindicam? Como surgiram? O contexto brasileiro tem alguma particularidade? Neste artigo, nossa missão é responder a essas perguntas por meio de uma análise sociológica sobre os movimentos sociais. Vamos compreender as suas características, a sua tipificação, a sua dinâmica e os diferentes exemplos que existem na sociedade.
Lembre-se de que esse é um assunto muito presente no Enem e nos vestibulares em geral, sempre pautando as provas de Humanidades e as propostas de Redação.
NAVEGUE PELOS CONTEÚDOS
O que são movimentos sociais? Como surgiram?
Os movimentos sociais são um comportamento coletivo que busca modificar ou conservar algum aspecto da realidade social. Eles se originam a partir do conflito e da insatisfação entre a sociedade e o Estado, e se relacionam com o reconhecimento dos direitos que compõem a cidadania, pois são uma forma da população se organizar, expressar os seus desejos e exigir os seus direitos.
Enquanto um fenômeno histórico e social, os movimentos sociais começaram a ser estudados entre os séculos 18 e 19, em razão das mudanças efervescentes da época, como a industrialização e o nascimento de uma nova classe social: o proletariado. É por isso que, no início, “movimento social” era sinônimo de movimento operário.
Com o desenvolvimento da história, diversos outros grupos surgiram e se organizaram em pautas distintas às do movimento operário. Vamos, então, entender as principais características dos movimentos sociais e as diferentes reivindicações pautadas por eles?
Características de um movimento social
Os movimentos sociais têm como principal característica a ação coletiva, com o objetivo de manter ou modificar alguma condição posta na sociedade, e essas ações podem se dar de maneira conjuntural ou estrutural.
- Conjuntural: surge por uma demanda específica e tem curto prazo. Exemplo: as Jornadas de junho, que ocorreram no ano de 2013 por todo o país, fomentadas pelo Movimento Passe Livre, contra o aumento da passagem do transporte público.
- Estrutural: visa conquistas a longo prazo. Exemplo: movimentos que lutam pelo fim do racismo e do machismo.

Segundo o sociólogo francês Alain Touraine (1925-2023), existem ainda três princípios definidores dos movimentos sociais. São eles:
- Princípio da identidade: o movimento social deve reconhecer a si mesmo como tal e possuir uma autoidentidade.
- Princípio da oposição: só se organiza a partir do reconhecimento do seu adversário, ou seja, é preciso que saiba reconhecer contra o que ou quem está lutando.
- Princípio da totalidade: trata-se do sistema de ação histórica de um movimento social e seus valores universais, ou seja, da sua existência histórica.
Já a filósofa Nancy Frase (1947-) também contribui para a compreensão acerca das características dos movimentos sociais. Assim, para a autora, as lutas empreendidas podem ser delimitadas de três formas: as lutas por redistribuição, as por reconhecimento e as lutas bivalentes.
- Por redistribuição: as lutas por redistribuição buscam a eliminação de injustiças de cunho econômico e social.

- Reconhecimento: busca a eliminação de injustiças no campo cultural. Exemplo: o Movimento LGBTQIA+ luta para que o casamento homoafetivo seja reconhecido oficialmente pelo Estado.
- Bivalentes: possuem reivindicações tanto no campo da redistribuição, quanto no campo do reconhecimento. Exemplo: o Movimento Feminista reivindica o fim da disparidade salarial entre homens e mulheres (redistribuição), além de também visar o fim do estereótipo sobre o corpo das mulheres (reconhecimento).
Como funcionam os movimentos sociais?
Os movimentos sociais se utilizam de diferentes práticas, considerando o momento histórico em que estão inseridos. No século 19, por exemplo, a singularidade do movimento operário foi o ludismo, que tinha como ação direta a destruição das máquinas de trabalho nas fábricas.
Nos dias atuais, diversas ações compõem o repertório de luta dos movimentos sociais. Elas variam conforme os anseios, as necessidades e os objetivos que cada um deles deseja transmitir ou reivindicar para a sociedade. Alguns exemplos são: greves, protestos, abaixo-assinado, campanhas na internet, passeatas, ocupações, entre outros.
Além disso, a composição de um movimento social é peça-chave para compreender o seu funcionamento. Por isso, a seguir, vamos diferenciar e entender os três principais tipos de movimentos sociais.
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Tipos de movimentos sociais
É possível estabelecer três tipos fundamentais de movimentos sociais: os conservadores, os reformistas e os revolucionários.
- Conservadores: buscam conservar o modo de ser (status quo), isto é, não querem mudanças na estrutura social. Por vezes há também o desejo de retomar aspectos do passado considerados superiores a aspectos do presente. Exemplo: Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG).
- Reformistas: a principal característica dos movimentos sociais reformistas é o desejo de alterar algum aspecto específico da sociedade. Por isso, as ações estão diretamente ligadas a reivindicações direcionadas ao Estado. Exemplo: o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), que luta pela reforma agrária.
- Revolucionários: caracterizam-se por mudarem completamente as estruturas da sociedade. Exemplo: os bolcheviques, que em outubro de 1917 derrubaram o Governo Provisório que se formou após a queda do czarismo em fevereiro do mesmo ano e instauraram a República Socialista Federativa Soviética Russa.
Exemplos de movimentos sociais
São diversos os movimentos sociais presentes na sociedade, e cada um deles carrega seus princípios e pautas. Vamos conhecer alguns?
Movimento negro
O movimento negro nasce da luta antirracista. Dessa forma, no contexto das leis separatistas dos Estados Unidos da América, eles emergem na luta contra a opressão racial, pela liberdade e por direitos civis sem distinção de raça.
O caso Rosa Parks foi o estopim para diversos protestos que eclodiram nos EUA, o que trouxe à tona nomes famosos como o de Martin Luther King e o discurso “I have a dream”.
No Brasil, a luta pelos direitos civis da população negra nasce nos quilombos, como o de Zumbi dos Palmares, fonte de resistência durante o período colonial.
Mesmo com a abolição da escravatura em 1888, por meio da Lei Áurea, a luta do movimento não se finda. No Brasil, embora não haja leis de segregação racial, a ausência de políticas públicas para a população recém liberta após a abolição abriu um abismo social que persiste na sociedade brasileira.
A influência do MNU
Influenciado pelos periódicos e associações que tratam sobre a questão do negro entre os séculos 19 e 20, na década de 1970, o Movimento Negro Unificado (MNU) estrutura-se no Brasil. Sua criação ficou marcada por uma grande manifestação em frente ao Teatro Municipal de São Paulo, em 1978.
O MNU é, então, uma organização de grande relevância na luta e nas conquistas da população negra no Brasil, e tem papel essencial na formulação de demandas do movimento negro durante a elaboração da Constituição Cidadã na Assembleia Constituinte de 1988; a criação do Dia Nacional da Consciência Negra em 20 de novembro (aniversário de morte de Zumbi dos Palmares); e na demarcação de terras quilombolas.
Outros impactos do movimento negro na legislação brasileira são:
- Lei n. 10.639: prevê a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileira nas disciplinas dos Ensinos Fundamental e Médio;
- Lei n. 12.711/12: estabelece as cotas raciais nas universidades;
- Lei n. 7.716: define como crime aqueles resultantes de preconceito de raça ou de cor;
- Lei n. 14.532/23: equipara racismo à injúria racial;
- Reconhecimento de Zumbi dos Palmares como herói nacional.
Movimento estudantil
O movimento estudantil envolve um conjunto de entidades políticas que tem como protagonistas os estudantes. Ou seja, é um movimento social organizado por e para os estudantes, com pautas vinculadas ao acesso e à permanência na educação.
No Brasil, o movimento estudantil começou a se organizar no início do século 20, a partir da Federação dos Estudantes Brasileiros, em 1901. Atualmente, sua entidade de representação máxima é a União Nacional dos Estudantes (UNE), fundada em 1937.

Outras entidades que representam os estudantes brasileiros são a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG).
As reivindicações do movimento estudantil estão diretamente ligadas à política nacional e local. Um exemplo é a luta para que 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do país seja direcionado para investimentos no setor da educação.
Movimento feminista
Defende o fim do patriarcado e o combate à desigualdade persistente entre homens e mulheres.
A organização do movimento feminista é feita a partir do que chamamos de ondas do feminismo, que atravessam diferentes momentos históricos. Vamos entendê-las?
- Primeira onda (final do século 19): marcada pela luta a favor do direito ao voto das mulheres pelas sufragistas em diferentes lugares do mundo, como EUA, Reino Unido e Brasil.

- Segunda onda (na década de 1960): fortemente influenciada pelas transformações sociais e culturais da época. Ultrapassou, então, a reivindicação por direitos políticos e se apropriou do debate da interseccionalidade, que olhava para as relações de opressão entre raça, classe e gênero. Os direitos reprodutivos e a sexualidade também ganham espaço.
- Terceira onda (a partir dos anos 1990): caracteriza-se pelas discussões sobre os estereótipos de gênero, com foco na diversidade.
Movimento LGBTQIA+
A Revolta de Stonewall, que ocorreu em Nova York no ano de 1968, é considerada um marco para a organização do movimento LGBTQIA+. Trata-se de uma série de protestos realizados pela população LGBTQIA+ contra o preconceito que sofriam nos EUA.
Principalmente no século 20, e ainda hoje em alguns países, tipifica-se a homossexualidade e a transgeneridade como doenças, o que resulta na negação de diversos direitos para uma parte da sociedade. Já no campo político-ideológico, isso acarreta preconceitos que se refletem tanto na vida cotidiana dessas pessoas, quanto na construção de políticas públicas.
Nesse sentido, o movimento LGBTQIA+ luta pelo reconhecimento e o direito que seus representantes tem de ser, de existir e de estar. Entre as reivindicações estão o direito ao casamento e a adoção entre casais homoafetivos, a garantia ao nome social, o acesso e a permanência à educação e ao mercado de trabalho, entre outros.
Movimento ecológico
Os movimentos ecológicos se organizam pela defesa ao meio ambiente. Eles se pautam na busca por mecanismos mais sustentáveis de desenvolvimento e com impacto positivo na intervenção humana sobre a natureza.
Sob o tripé da sustentabilidade (que compreende o âmbito social, econômico e o ambiental), os movimentos ecológicos começam a se estruturar na segunda metade do século 20, a partir da crítica ao consumo excessivo.
Assim, há uma preocupação com a proteção da biodiversidade para que as futuras gerações possuam condições para existir.
Muitos se mobilizam em organizações não governamentais, como o Green Peace e o WWF (World Wide Fund for Nature).

Surgimento dos movimentos sociais no Brasil
Não há, entre os estudiosos brasileiros, concordância sobre o momento exato em que os movimentos sociais surgiram no Brasil. Alguns teóricos apontam que a origem está na resistência dos quilombos, durante o período colonial e na luta pela abolição da escravatura. Outros indicam que o seu marco é o operariado brasileiro, que começou a se estabelecer no país durante a Primeira República.
Essa divergência se dá porque, entre 1889 e 1930, o país viveu uma forte resistência do movimento operário, quando o novos trabalhadores assalariados do Brasil – imigrantes europeus pobres – se depararam com condições insalubres de salário e moradia.
A situação resultou em greves nas principais cidades do país, com reivindicações que tratavam das jornadas de trabalho, da segurança, do direito à sindicalização e mais.
Outras mobilizações que marcam a Primeira República do Brasil foram: a Guerra de Canudos (1896-1897), a Revolta da Vacina (1904), a Revolta da Chibata (1910) e a Guerra do Contestado (1912-1916).
Resumo: movimentos sociais
- Os movimentos sociais são um fenômeno histórico e social que englobam comportamento coletivo que busca modificar ou conservar algo na sociedade;
- A ação dos movimentos sociais se dá na busca pelo acesso e pela garantia dos direitos de cidadania;
- Eles podem ser conjunturais ou estruturais e possuem três princípios básicos: da identidade, da oposição e da totalidade;
- Existem três tipos de movimentos sociais: os conservadores, os reformistas e os revolucionários;
- O movimento negro, o movimento feminista, o movimento estudantil, o movimento LGBTQIA+, o movimento ecológico são exemplos de movimentos sociais;
- No Brasil, acredita-se que os quilombos tenham sido a primeira organização coletiva em torno de uma pauta, assim como o operariado durante a Primeira República do Brasil.
Como os movimentos sociais caem no Enem e nos vestibulares
Essa temática é relevante para as provas e costuma abordar a importância dos movimentos na construção e transformação da sociedade.
Exemplo 1
Neste exemplo, aborda-se o movimento LGBT como um desafio às formas de condenação e perseguição social, destacando a luta pela afirmação identitária e pelo respeito à diversidade sexual.
(Enem PPL 2017) No Brasil, assim como em vários outros países, os modernos movimento LGBT representam um desafio às formas de condenação e perseguição social contra desejos e comportamentos sexuais anticonvencionais associados à vergonha, imoralidade, pecado, degeneração, doença. Falar do movimento LGBT implica, portanto, chamar a atenção para a sexualidade como fonte de estigmas, intolerância, opressão.
In: BOTELHO, A.; SCHWARCZ, L. M. Cidadania, um projeto em construção. São Paulo: Claro Enigma, 2012 (adaptado).
O movimento social abordado justifica-se pela defesa do direito de
a) organização sindical.
b) participação partidária.
c) manifestação religiosa.
d) formação profissional.
e) afirmação identitária.
Resposta: [E]
Os questionamentos feitos pelo movimento LGBT buscam encontrar alternativas para que a identidade daqueles que fogem aos padrões normativos de sexualidade possa ser respeitada e não tratada com violência.
Exemplo 2
Aqui, a questão aponta a mobilização do movimento negro como impulsionadora de mudanças legais, como a partir da Lei 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas nas escolas.
(Enem 2ª aplicação 2016) A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorização e afirmação de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser particularmente apoiada com a promulgação da Lei 10.639/2003, que alterou a Lei 9.394/1996, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas.
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorraciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana. Brasília: Ministério da Educação, 2005.
A alteração legal no Brasil contemporâneo descrita no texto é resultado do processo de
a) aumento da renda nacional.
b) mobilização do movimento negro.
c) melhoria da infraestrutura escolar.
d) ampliação das disciplinas obrigatórias.
e) politização das universidades públicas.
Resposta: [B]
A promulgação de leis que defendam ou valorizem determinados grupos só se dá por meio da mobilização política e o movimento negro é um exemplo de movimento social politicamente bem atuante.
Exemplo 3
Neste exemplo, avalia-se a persistência da discriminação de gênero mesmo diante das transformações sociais ao longo do século 20.
(UCS 2012) Apesar de todas as mudanças sociais, culturais, econômicas, políticas, dos meios de comunicação e de valores ocorridas no século XX, a discriminação da mulher é ainda um fato comum na sociedade atual.
Considere as seguintes afirmações sobre o papel da mulher na sociedade brasileira.
I. Getúlio Vargas, em 1934, promulgou uma Constituição que dava às mulheres o direito de voto e o direito de serem votadas.
II. A participação feminina na população economicamente ativa, a partir da década de 60, teve um aumento significativo, devido à necessidade de as mulheres trabalharem fora de casa para ajudar no orçamento familiar.
III. As mulheres organizaram várias ONGs feministas, na década de 80, para terem participação na vida social e política nacional, e nessa década foi criado o Conselho Nacional da Condição Feminina, ligado ao Ministério da Justiça.
Das afirmações acima,
a) apenas I está correta.
b) apenas II está correta.
c) apenas III está correta.
d) apenas II e III estão corretas.
e) I, II e III estão corretas.
Resposta: [E]
Todas as afirmativas estão corretas. A inserção da mulher na política brasileira ocorre forma paulatina, segundo transformações sociais e reivindicações do movimento feminista. No entanto, ainda não se pode dizer que esse tipo de discriminação terminou.