O que foram as jornadas de junho de 2013 no Brasil?
As manifestações começaram como mobilização de jovens em São Paulo contra o aumento de R$ 0,20 na passagem de ônibus e modificaram a paisagem política nacional brasileira
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Em 6 de junho de 2013, um protesto organizado pelo Movimento Passe Livre (MPL) chegou à Avenida Paulista, no centro de São Paulo. A manifestação, que se repetiu no dia seguinte, reuniu duas mil pessoas e tinha como alvo o aumento nas tarifas de ônibus e metrô. Foi o estopim de um movimento que alcançaria amplitude nacional e ficou conhecido como jornadas de junho.
NAVEGUE PELOS CONTEÚDOS
O que foram as jornadas de junho de 2013?
A luta por serviços públicos de qualidade e acessíveis manteve-se como fio condutor dos protestos, ao lado de temas como a corrupção. Indivíduos de variados espectros políticos-ideológicos se manifestaram por quase todo o território nacional, tendo São Paulo como o epicentro a mobilização.
O auge das jornadas de junho de 2013 aconteceu no dia 20, com mais de 1 milhão de pessoas nas ruas de 25 capitais brasileiras, além de 100 outras cidades - 300 mil apenas no Rio de Janeiro.
Naquele mês, o Brasil abrigaria a Copa das Confederações, prévia da Copa do Mundo da Fifa que aconteceria no país em 2014. Assim, o contraste entre as obras faraônicas que serviriam ao evento e a situação de penúria dos serviços públicos nacionais era uma imagem recorrente nos protestos.
O slogan que exigia uma educação "padrão Fifa" se tornou um dos mais conhecidos, assim como a expressão "o gigante acordou".
Repressão policial nas jornadas de junho
A tática dos black blocks, que se vestiam com máscaras e roupas pretas e provocavam a polícia militar, ficou mais conhecida na manifestação de 11 de junho. Os governos do Estado de São Paulo e da prefeitura da capital condenaram o vandalismo dos protestos. Porém, a repressão policial desmedida na noite de 13 de junho, com inúmeros feridos, mudou o posicionamento da opinião pública.
Outras cidades se mobilizaram, como Rio de Janeiro e Porto Alegre, e a pauta dos protestos foi rapidamente se ampliando.
Em 15 de junho, na abertura da Copa das Confederações, em Brasília, manifestantes foram duramente reprimidos pela polícia militar fora do estádio. Então, nos dias 17 e 18, os protestos reuniram públicos ainda maiores, com 50 mil pessoas apenas na Praça da Sé, na capital paulista.
Logo, os manifestantes conquistaram sua primeira vitória: governos de São Paulo e Rio de Janeiro cancelaram o aumento das passagens. Já o auge de mobilizações em 20 de junho foi seguido pelo bloqueio de 13 rodovias no paulistas no dia seguinte.
O fim do mês de junho teve o Brasil como campeão da Copa das Confederações. Enquanto isso, os protestos em declínio e interrogações sobre os rumos que a nação iria tomar depois de tamanho movimento democrático se acumulavam.
Na história recente do país, um exemplo de mobilização de massa nessa escala foram as Diretas Já (1983-1984), que defendiam o retorno das eleições diretas para a presidência da república nos últimos anos da ditadura militar (1964-1985).
Um movimento global
É importante considerar que as jornadas de junho no Brasil podem ser compreendidas em um contexto internacional de revoltas democráticas entre 2011 e 2013.
Na Primavera Árabe (2010-2011), por exemplo, manifestações se espalharam com foco em ditaduras tomadas pela corrupção. Diante disso, regimes autoritários caíram na Tunísia, no Egito e na Líbia, mas a interrupção dos processos de redemocratização e a repressão levaram desilusão a diversos países árabes.
O mês de junho de 2013 também marcou a Turquia, outro país de redemocratização recente, como o Brasil. A proposta de substituir o Parque Gezi, uma das poucas áreas verdes no centro de Istambul, por um shopping center e uma nova mesquita, revoltou a população.
A praça Taksim, vizinha ao parque, se tornou palco de grandes protestos contra o governo de Recep Tayyip Erdoğan. Ele completava 10 anos no poder e apoiava o projeto em nome do “desenvolvimento urbano”.
Reflexos das jornadas de junho no Brasil
O sistema político brasileiro não soube canalizar os anseios decorrentes das jornadas de junho de 2013. Os principais partidos não perceberam que o núcleo essencial de um movimento de massas dessa magnitude envolveria rearranjos profundos justamente na forma de fazer política.
Desde então, tendências ideológicas completamente díspares governaram o país, nenhuma com sucesso em tocar nos pontos centrais do movimento de 2013, como a melhoria dos serviços públicos e o tema da
corrupção.
No podcast O Assunto, para entender o impacto dos protestos na última década, a jornalista Natuza Nery conversou com Roberto Andrés, professor da escola de arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e autor do livro “A razão dos centavos: crise urbana, vida democrática e as revoltas de 2013”:
Entre várias reflexões, Andrés observou que a pauta da tarifa zero, uma demanda que foi vista como “irrealista e impossível” em 2013, é uma realidade no Brasil atual: hoje, mais de 70 cidades já adotaram a política, servindo mais de 3,5 milhões de pessoas.